17 de jun. de 2011

ABC da maniçoba

Guardado por mais de noventa anos na memória de João de Guidú, que os aprendeu com Bié, os versos do ABC da maniçoba registraram aspectos e informações importantes sobre a Influência da Maniçoba (1904-1914). A maniçoba, ou pé de pataca produz um látex que durante o início do século atingiu um elevado valor no mercado e representou um verdadeiro garimpo para os sertanejos, inclusive na região de Uibaí, Mirrorós e Iguitú, onde os pequenos povoados foram invadidos por multidões de forasteiros. Há outra versão do ABC que se encontra no livro Canabrava do Gonçalo de Osvaldo Alencar Rocha e Edimário Oliveira Machado recolhido com Faburino Rocha.

Antonio de Celina e João de Guidu atribuem a Firmino Serra Grande a autoria do ABC da maniçoba. Muito do que se sabe sobre esse poeta é envolto de dúvidas e suposições. João de Guidú nos conta a história de que Firminin era um comerciante que num desafio de repente contra um rico barqueiro em Xique-Xique venceu e “enricou” se tornando fazendeiro. Antonio o conheceu já velho, pai do fazendeiro e poeta Antonin Serra Grande e desconhecia a antiga profissão de comerciante de Firmino, mas confirma a sua vocação poética.

As vivença desse mundo

Não há quem possa pensá

Os inocente d’agora

Já querem negociá

Quem me dera maniçoba

Nessa terra se acabá

Bem vontade que eu tinha

De tamém sê comprado

Eu num entro nesse mercado

É por que meu vale acabô

Maniçoba de sessenta

Já tem muito atacadô

Com certeza maniçoba

Hoje é quem vale tudo

Compradô de maniçoba

É preciso ter estudo

Se pegá cum muita upa

No final vem perdê tudo

Eu nunca vi uma gente

Como a do Barro Vermeio

Do Gentio ao Miroró

Todo mundo é capanguêro

A treta anda na frente

Não sei se terão dinhêro

Foi mercê que Deus fez

O dinheiro vim na terra

Mas quêra Deus que maniçoba

Num venha se acabá em guerra

Pois os besta tão dizeno

Que os ladino tamém erra

Grande guerra nesta terra

Todo mundo em confusão

Quem fura tal maniçoba

Num planta mie nem fejão

Quando vinhé arependê

É tarde meus irmão

Home muito nessa terra

Porem poços catinguêro

Compradô de maniçoba

É preciso tê dinhêro

Senão vai inxuvriado

E leva o nome de trêtero

Ignora esse mercado

É maniçoba sem lavá

A mil réis, a dois cruzado

Todo mundo qué comprá

Por causa da maniçoba

Fez farinha cariá

Já fui ao Barro Vermeio

Pra minha capanga fazê

A cachaça era tanta

Que eu não pude me entretê

Cada hora e cada instante

De eu vê gente morrê

Kilo e meio de maniçoba

É dinhero pur dimais

Dinhero de maniçoba

Faz as vêis de satanás

E quem num esquecê da roça

Ôto tanto tamém faz

Lembro e faço pensão

Maniçoba num que dá

Quem fura tal maniçoba

Sei que num que trabaiá

Não sei como hão de fazê

Quando a xeringa cabá

Não se iluda, minha gente

Maniçoba num é nada

Quem fura tal maniçoba

Eu vejo é cum a vida arriscada

Uns furano, ôtos panhano

Segue uma vida danada

Orrô de facada e tiro

Tamo veno a todo instante

Quelé Dunga [1]veno isso

Retirou-se para Tanque

Dinhero de maniçoba

Faz as vêis de diamante

Quem fura tal maniçoba

Num acredita em Deus

O orguio é dimais

Faz disconhecê os seus

Toma café e num oferece

Esses irmãos num são meus

Rasgam a rôpa no mato

E num trata de comprá ôta

Vão se queixá a famia

“Minhas calça estão rôta

Cuida da roda, muié

Pra me dá ota rôpa”

Se maniçoba num baxá

Vai ficá rico o sertão

Eu preciso trabaiá

Pra comprá a Conceição

Tem dinhero com fartura

Ta chegano bem por hora

Os que tão dentro da transa

Tão se vendo na enrola

Se meu julgo fô certo

Muita gente boa chora

Xorano fico uns pouco

Por não poderem comprá

Papai Veio do Guigó

Tá comprano sem lavá

Mas levo três dia no mato

Em jejum sem almoçá



[1] Clemente Francisco Nunes, natural do Guigó,. era pai de Cassimiro “Budin” Nunes que foi casado com Brígida Rocha de Uibaí

3 comentários:

  1. MUITO BOM!!

    MUITO RICO E INTERRESSANTE A HISTORIA CONTA EM FORMA DE POESIA.COMO TAMBÉM SABERMOS QUE DESDE SEMPRE
    TEMOS CULTURA EM UIBAI!!!

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  2. Pessoal, interessante este blog. O kuriu me passou alguns exemplares impresso de "A Indaga". Moro em são paulo faz 3 anos, estive em Uibai em dezembro, vocês estão distribuindo o material impresso? Se sim, como posso fazer pra me enviarem? Uma dica, é interassante colocar botões de compartilhamento dos post's em redes sociais (Facebook,etc) para autemtar o campo de alcance do blog. Ja postei o link deste no meu blog para que os visitantes do mesmo visetem este aqui também. Abs

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  3. Opa, correção, ví que no topo deste já há o botão de compartilhamento. Mas me digam se estão distribuindo o material impresso. abs

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