5 de mai. de 2011

Aniversário de Irecê: a falsa polêmica



A data de aniversário de Irecê é um falso problema, não representando nenhum mistério. É público que Irecê foi emancipada em 02 de março de 1926 pelo governador Francisco Marques de Góes Calmom. Caraíbas foi elevada a vila em 1910. A razão da emancipação em 1926 foi o conflito pela disputa da intendência de Morro do Chapéu entre Teotônio Marques Dourado Filho e Antônio da Souza Benta. Após tensa eleição em 1924 com vitória para Tiozinho e cerco de Morro por jagunços de Benta, em 1926 houve a realização de eleições separadas onde cada partido se autodeclarava vitorioso. Para resolver o impasse, o governo estadual dividiu o município em dois: Morro do Chapéu iria para as mãos do grupo de Antônio Benta e o novo município, com sede em Caraíbas de Hermógenes, denominado Irecê, passaria às mãos da família Dourado. Os detalhes da história podem ser encontradas na dissertação de mestrado de Jedean Gomes Leite intitulada “Terra do frio”: coroneis de sangue quente? disponível na internet.
Ocorre que a chamada “revolução” de 1930, que levou ao poder Getúlio Vargas, tomou medidas ultracentralizadoras para administração do país e do Estado da Bahia. A extinção dos municípios já havia acontecido em Campestre e em Barra do Mendes, quando os coroneis Manuel Frabrício de Oliveira e Militão Rodrigues Coelho, derrotados pelas milícias de Horácio de Matos, foram alijados do poder político com a suspensão de seus municípios que visava o enfraquecimento de seus líderes. Com uma canetada só o interventor Artur Neiva riscou do mapa uma série de municípios através do Decreto número 7479 de 8 de julho de 1931. Entre eles temos Jaguaribe, Guaray, Uauá, Cumbe e Irecê.
Porém, Juracy Magalhães, cearense, interventor na Bahia sabia que para conseguir a plena hegemonia política era preciso cativar os líderes do interior e com o Decreto número 8.452 de 31 de maio de 1933 reestabelece alguns dos municípios extintos. Entre eles, Irecê, que havia sido reduzida a sub-prefeitura de Morro do Chapéu.
Desse modo, conclui-se que Irecê se emancipou de Morro do Chapéu em 1926, foi reduzido a sub-prefeitura em 1931 e re-estabelecido em 1933. A escolha de data de emancipação “correta” é uma questão política que envolve alguns interesses e não é somente uma questão técnica de estabelecer a verdade histórica. Vejamos ligeiramente os interesses.
Adélio Dourado, em seu livro Família Dourado, diz que dois de agosto de 1926 é a data de “criação do município de Irecê” (p. 18). Essa data remete ao conflito entre os Dourados e Antônio Benta. O simbolismo da data para a família Dourado é enorme, já que a emancipação política é apresentada como uma vitória de Tiozinho – o pacifista – contra Benta, chefe de jagunços. Na verdade, a emancipação foi um acordo de coroneis que dividiram o município para cada qual mandar em seu pedaço.
Jackson Rubem em seu livro Irecê: história, casos e lendas coloca a data de emancipação como uma polêmica. Mas na verdade, no fim dos anos 1980, Reynaldo La Banca em seu trabalho Monografia história. Capital do feijão e da mamona. Irecê-Ba já descrevia em detalhes a “Emancipação de Irecê” em 1926 e a “Reinstalação municipal” de 1933. Não há, pois problema.
Irecê teve sua estrutura administrativa municipal instalada duas vezes, como Cotegipe, Barra do Mendes, Uauá e Monte Alto. Não há mistério nisso. Os documentos que comprovam isso são leis estaduais, ou seja, registros públicos. O jornal Correio do Sertão de Morro do Chapéu noticia os fatos. E a coleção dos jornais entre 1917-1940 já foi disponibilizada em forma digital por professores e pesquisadores vinculados ao Campus IV da Uneb em Jacobina. Não há problema, portanto, de falta de registros. Porém, a história de Irecê ainda está por ser escrita.Cidade instalada duas vezes, Irecê tem duas datas (dois de agosto e 31 de março) simbólicas, uma de emancipação e uma de reinstalação. Nenhuma das duas representa simbolicamente um acontecimento muito importante, já que a primeira foi um acordo de coroneis para cada qual ficar com seu curral eleitoral e a segunda um ato administrativo de um interventor autoritário que queria agradar chefes locais e trazê-los para debaixo de sua saia. Não houve movimentação popular para nenhuma das datas. Debater outros problemas como as articulações políticas para trazer para o município benefícios como estradas, recursos públicos, maquinário, crédito, escolas, poços, etc., polemizar sobre os males que o desenvolvimento capitalista trouxe para nossa região e discutir se existe realmente uma “reforma agrária natural” na região de Irecê são mais importantes do que polêmicas vazias de um problema que já se resolveu.

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