24 de fev. de 2010

Vicente Veloso e a escravidão




Vicente Veloso era livre por atitude, escravizado por lei!
Vicente Veloso, preto de cor, escravo por lei, livre de fato! Oprimido por um sistema violento que o reduzia a coisa, a posse alheia, a mercadoria que figurava ao lado de bois, cabras, mulas, éguas e não como gente. Vicente rebelou-se e decidiu assaltar o sertão: usou da violência libertadora contra o senhor violento e conquistou a sua liberdade na marra. Recusou o destino que o sistema lhes reservava e que os seus senhores mais aguardavam: trabalhar até a morte completa, ou, até uma velhice para ser entregue a deus-dará, à caridade pública, a virar um esmoler.
A lei Áurea, a famosa abolição em 1888, não acabou com a escravidão. Ela acabou com a legislação que permitia que pessoas fossem reduzidas a coisas, a peças com um valor, um preço e uma função: gerar riqueza para seu dono. A exploração continuou! O racismo continuou! A pobreza dos que trabalham continua... Dias e dias de trabalho geram a riqueza dos patrões, dos donos das terras, dos mercados e das mansões e não são suficiente para matar a fome. A repressão, a violência do Estado e da classe dominante mudou de forma, mas segue sem transformação alguma o conteúdo!
Os filhos de Vicente Veloso não são mais “escravos” segundo a lei; mas precisarão se levantar para serem LIVRES de verdade!
A escravidão colonial significou arrancar violentamente dezoito milhões de pessoas de suas terras na África e trazê-las para trabalhar na América até morrerem, até esgotarem, para que dessem o maior lucro que fosse possível. Significou exterminar perto de cento e cinqüenta milhões de indígenas americanos para tomar suas terras, para tirar deles até a última gota de trabalho.
Onde houve escravidão, houve resistência.
Vicente Veloso foi um negro escravo que matou seu senhor em Jacobina, isso por volta do início dos anos 40 do século XIX. Segundo o poeta Valmir Rosa “ele se revoltou contra o patrão e entraram em luta corporal e ele derrubou o patrão lá por cima de umas pedras e tirou uma espada que o patrão portava na cintura e sangrou o patrão deixando ele lá inerte sobre uma poça de sangue” Fugiu, caiu no mato.
Como diziam os negros “Deus é grande, o mato é ainda maior”. Jacobina, importante centro minerador, possuía registros de quilombos desde 1726. Consta, também, que no início de 1806, uma expedição que partiu de Xique-Xique em busca de ouro encontrou alguns quilombos no alto de umas serras.
Depois de andar por alguns dias, talvez em busca de companheiros fugidos, talvez apenas fugindo dos capitães-do-mato, que tentariam levá-lo de volta à escravidão, Vicente Veloso deu pelas terras de Canabrava.
“Segundo os nossos informantes, e alguns parcos registros que encontramos, no final da primeira metade do século XIX, isto por volta de 1844, um escravo de nome Vicente Veloso, fugindo da região mais próxima ao litoral para as brenhas do sertão, veio se encontrar sua liberdade nas encostas da Serra das Laranjeiras, ou Serra Azul, onde viveu por algum tempo escondido da terrível repressão dos capitães-do-mato.” (Osvaldo Rocha e Edimário Oliveira, Canabrava do Gonçalo)
Vicente Veloso encontrou terras que não tinham dono. Terras de ninguém. Isso, porque, ao longo dos séculos XVII e XVIII, os invasores portugueses fizeram uma tática de guerra de terra arrasada contra os povos indígenas que habitavam os sertões. Os povos indígenas resistiram bravamente, foram inimigos terríveis. Sua guerra em defesa de sua terra só terminou quando foram exterminados. Muitos foram escravizados, viraram sem-terra, foram obrigados a esquecer sua cultura, sua língua, suas raízes.
Essa é a história. Foi assim que Uibaí começou. Um escravo matando seu senhor e indo em busca da liberdade. Ela chega a uma terra lavrada com sangue de guerras contra os povos indígenas. Um mito rebelde que temos que manter. Que temos que resgatar. Que temos que reivindicar. Uma luta que temos que continuar.
Todos aqueles que trazem no rosto, no sangue, na memória, na pele, na vida, as marcas de cinco séculos de opressão, de guerra, mas também de resistência, de luta contra a escravidão, somente esses podem dizer: Vicente Veloso vive! Está presente!
Venceslau Pereira Machado era um pequeno criador a agricultor. Provavelmente, pressionado pelas dificuldades econômicas na Serra do Assuruá, juntou suas tralhas, sua numerosa família, seus 3 escravos e partira para os confins da caatinga onde as promessas de Vicente anunciavam água farta e terra fértil. Vicente partiu, sabe-se lá para onde. Venceslau, pequeno proprietário de escravos em ruína econômica se apossou das terras e fez sua morada na beira do riacho Canabrava. No montante de sua riqueza, quando faleceu em 1850, a fazenda Canabrava valia 500$000 (quinhentos mil reis), enquanto Maria Africana valia 400$000 e o menino Antonio custava 300$000.
A primeira canabravense, provavelmente, foi uma pessoa escravizada. Tudo indica que era filha da africana Maria com algum filho de Venceslau (senão com o próprio) já que ela era cabra, ou seja, de cor clara. Se fosse filha de um africano, seria crioula; se fosse filha de um branco, seria mulata; como era filha de uma africana com alguém da família de Venceslau, era cabra. Manoela, o seu nome, possuía um ano de idade em 1950. Não obstante não ter havido exploração de trabalho de escravizados, nem relatos de fugas, violência e castigo, apesar de não ter havido escravismo na fazenda Canabrava não podemos esquecer uma coisa. A escravidão não deixou de ser violenta: quando houve a partilha dos bens de Venceslau entre seus herdeiros, a escrava Maria foi vendida. Vendida como se fosse um tamborete, uma peça, uma coisa qualquer que custava muito, mas não o suficiente ao que merece uma vida humana. Sendo a provável mãe de Manoela temos aí um episódio de violência estarrecedora: a separação forçada entre mãe e filha, evento de uma violência enorme. A terra que viu há pouco o exemplo de liberdade se salgava com as lágrimas de Maria e Manoela. Lágrimas também derramadas por Domingos Cabra, trocado em 1870 pela fazenda São Gabriel.

3 comentários:

  1. oi bom dia preciso te connherce vc ainda ta morando no uibai queria te conhecer manda ai teu endereço gostei muito do arquivo e gostaria muito em te conhecer vc , moro e m irece mais tenho o maior prazer em te conhecer e tirar uma foto com vc sou um amate de historia adorei esses arquivo manda noticia por favor queria te conhercer essa semana blz o falar q eu vou ai te ver blz..........

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