Muito se discute a crise dos socialistas. Alguns autores a sistematizaram como crise teórica, crise organizativa e crise programática. Elas dizem respeito aos conhecimentos necessários para a luta revolucionária, os instrumentos de luta e os objetivos a curto, médio e longo prazo estabelecidos. Trataremos, aqui, da segunda crise, a organizativa.
Primeiro, pergunta-se: por que estamos em crise? Crise pode representar duas coisas. Mais comumente, refere-se à dificuldade, carência e outras características negativas. Assim, as organizações, hoje, estariam fadadas ao fracasso e à incapacidade de comandar as lutas revolucionárias. Se procurarmos o sentido etimológico de crise, veremos que a mesma trata de período de transição, o que pode acarretar em dificuldades, mas, também é um período de aprendizado, originalidade e oportunidade.
Desse modo, podemos dizer que as organizações da luta socialista estão passando por dificuldades e não tem conseguido avançar nas lutas e que é preciso que elas revejam sua prática de modo a adaptarem-se aos novos tempos que chegam.
Poderíamos também perguntar: crise em relação a quê? Nos dois sentidos utilizados, então, a pergunta se desdobra em duas: há uma dificuldade das organizações socialistas de fazer agora o que faziam antes – a luta revolucionária – e há uma necessidade de adaptação dos socialistas à nova forma de organização que as lutas do século XXI exigem. Bom, poderíamos então dizer que as organizações de luta dos trabalhadores do século XX, sobretudo os sindicatos e partidos políticos estão em dificuldades e não são mais capazes de levar adiante a luta revolucionária. Seria preciso, portanto, refazer as formas de luta para o novo contexto que se apresenta e pensar novas organizações ou novas formas de luta.
Por quê os sindicatos estão em crise? Ora, a primeira resposta, mais evidente, reside nas novas formas de acumulação de capital existentes. São formas chamadas flexíveis, capazes de driblar a legislação trabalhista e a organização dos trabalhadores. Isso porque os sindicatos brasileiros possuíram uma tradição que foi a de acomodar-se à institucionalidade. Desde o sindicalismo do PCB até o novo sindicalismo do PT, passando por outras formas de sindicatos, a luta sindical procurava-se arranjar à institucionalidade do Estado e garantir as vantagens que o Estado Varguista começou a lhes oferecer – imposto sindical, estabilidade, segurança, negociação, legitimidade – e negar as coisas ruins do mesmo – a dependência do Estado. O problema é que são duas faces da mesma moeda juntas. Ao não abrir mão do poder institucional que o Estado dava aos sindicatos, os mesmos ficaram atrelados ao mesmo. De certa forma, ao invés de conseguir legitimidade dentro da classe trabalhadora, primeiro, os sindicatos mais se preocuparam em consegui-la do Estado e apresentá-la aos seus membros como uma insígnia de prestígio e uma garantia de poder. Assim, os sindicatos compraram o poder e amararam-se no Estado. Como o Estado é capitalista, a estrutura sindical e a legislação brasileira oferecem inúmeras dificuldades para lutar contra ela, pois faz parte dela. Há racionalidade em fazer com que os sindicatos lutem contra o Estado capitalista quando fazem parte dele? A evidência disso é que o sindicalismo dos serviço público é muito mais lento e complexo do que o do setor privado e que a mobilização em sindicatos dos trabalhadores rurais é rara, sendo que estes conseguem mais garantia de existência por pertencerem à institucionalidade estatal do que serem “representantes” de categorias da classe trabalhadora no campo.
E os partidos? Por que tornaram-se incapazes de lutar contra o sistema? A sua ligação com a institucionalidade é a explicação básica para isso – apesar de não ser a única e não explicar sozinha a crise. Ora, os partidos políticos socialistas apresentam dificuldades em conseguir estabelecer diálogo com a imensa maioria da população brasileira. A cultura de uma política personalista no Brasil enfraquece até mesmo os partidos da ordem. E o fato de a intelectualidade socialista brasileira estar ligada intrisecamente ao aparato institucional da universidade é outro fator que explica as dificuldades de avanço socialista. A maior parte dos quadros dos partidos socialistas é formada no circuito do movimento estudantil universitário. Os mesmos apresentam alguns vícios: um profundo conhecimento “teórico”, mas, em conseqüência da carência de extensão da universidade na sociedade e da tendência à hiperespecializaçaõ acadêmica, desconhecem profundamente o Brasil real. São capazes de elaborarem artigos acadêmicos, teses, manifestos e artigos de jornal de excelente qualidade, mas não tem conseguido traduzi-los à linguagem popular, ou seja, a linguagem da prática política. E não apresentam um questionamento profundo da institucionalidade estatal por viverem da mesma, na maioria das vezes. Ocupados com questões de especialidade geral, não são capazes de fazerem compreender a unidade geral das especificidades.
Não tratemos, porém, de desistir ou anunciar o fracasso. Pelo contrário, o otimismo da vontade é mais necessário em tempos difíceis. Nesse caso, crise também deve significar oportunidade de revitalização. Ao invés de partidos que tratem de especialidades gerais que não estão presentes na vida cotidiana da maioria da classe trabalhadora, é preciso a criação de organismos locais de luta política que partam dos problemas locais que afligem o povo para, não através de textos longos ou de cursos maçantes, mas de prática política acompanhada de reflexão teórica, estabelecerem os nexos existentes entre a falta de merenda escolar, a falta de banheiro, a carência de moradia para os pobres e o desemprego e ausência de perspectiva para a maioria da juventude trabalhadora com o capitalismo, o Estado, o antagonismo entre capital e trabalho e a transitoriedade do tempo histórico.
Não que os partidos não devem existir. De modo algum! Eles são necessários, nem que seja para ensinar o que não deve ser feito. Todavia, eles partem do geral e não conseguem chegar no particular. Falam uma língua estranha do povo e estão ausentes do cotidiano da classe trabalhadora. Devemos apostar nossas fichas numa crise revolucionária que vai, aparentemente por si, formar consciência de classe revolucionária nas massas para que os partidos sejam uma direção? Ou seja, partir do geral e permanecer na generalidade? Ou, então, é preciso partir do particular, do específico, do cotidiano e, através da criação constante de fatos políticos, estimular a formação de um contexto de educação em que a classe se educa para a luta política, num processo que parte do particular para a totalidade?
Uibaí, inverno de 2010
Primeiro, pergunta-se: por que estamos em crise? Crise pode representar duas coisas. Mais comumente, refere-se à dificuldade, carência e outras características negativas. Assim, as organizações, hoje, estariam fadadas ao fracasso e à incapacidade de comandar as lutas revolucionárias. Se procurarmos o sentido etimológico de crise, veremos que a mesma trata de período de transição, o que pode acarretar em dificuldades, mas, também é um período de aprendizado, originalidade e oportunidade.
Desse modo, podemos dizer que as organizações da luta socialista estão passando por dificuldades e não tem conseguido avançar nas lutas e que é preciso que elas revejam sua prática de modo a adaptarem-se aos novos tempos que chegam.
Poderíamos também perguntar: crise em relação a quê? Nos dois sentidos utilizados, então, a pergunta se desdobra em duas: há uma dificuldade das organizações socialistas de fazer agora o que faziam antes – a luta revolucionária – e há uma necessidade de adaptação dos socialistas à nova forma de organização que as lutas do século XXI exigem. Bom, poderíamos então dizer que as organizações de luta dos trabalhadores do século XX, sobretudo os sindicatos e partidos políticos estão em dificuldades e não são mais capazes de levar adiante a luta revolucionária. Seria preciso, portanto, refazer as formas de luta para o novo contexto que se apresenta e pensar novas organizações ou novas formas de luta.
Por quê os sindicatos estão em crise? Ora, a primeira resposta, mais evidente, reside nas novas formas de acumulação de capital existentes. São formas chamadas flexíveis, capazes de driblar a legislação trabalhista e a organização dos trabalhadores. Isso porque os sindicatos brasileiros possuíram uma tradição que foi a de acomodar-se à institucionalidade. Desde o sindicalismo do PCB até o novo sindicalismo do PT, passando por outras formas de sindicatos, a luta sindical procurava-se arranjar à institucionalidade do Estado e garantir as vantagens que o Estado Varguista começou a lhes oferecer – imposto sindical, estabilidade, segurança, negociação, legitimidade – e negar as coisas ruins do mesmo – a dependência do Estado. O problema é que são duas faces da mesma moeda juntas. Ao não abrir mão do poder institucional que o Estado dava aos sindicatos, os mesmos ficaram atrelados ao mesmo. De certa forma, ao invés de conseguir legitimidade dentro da classe trabalhadora, primeiro, os sindicatos mais se preocuparam em consegui-la do Estado e apresentá-la aos seus membros como uma insígnia de prestígio e uma garantia de poder. Assim, os sindicatos compraram o poder e amararam-se no Estado. Como o Estado é capitalista, a estrutura sindical e a legislação brasileira oferecem inúmeras dificuldades para lutar contra ela, pois faz parte dela. Há racionalidade em fazer com que os sindicatos lutem contra o Estado capitalista quando fazem parte dele? A evidência disso é que o sindicalismo dos serviço público é muito mais lento e complexo do que o do setor privado e que a mobilização em sindicatos dos trabalhadores rurais é rara, sendo que estes conseguem mais garantia de existência por pertencerem à institucionalidade estatal do que serem “representantes” de categorias da classe trabalhadora no campo.
E os partidos? Por que tornaram-se incapazes de lutar contra o sistema? A sua ligação com a institucionalidade é a explicação básica para isso – apesar de não ser a única e não explicar sozinha a crise. Ora, os partidos políticos socialistas apresentam dificuldades em conseguir estabelecer diálogo com a imensa maioria da população brasileira. A cultura de uma política personalista no Brasil enfraquece até mesmo os partidos da ordem. E o fato de a intelectualidade socialista brasileira estar ligada intrisecamente ao aparato institucional da universidade é outro fator que explica as dificuldades de avanço socialista. A maior parte dos quadros dos partidos socialistas é formada no circuito do movimento estudantil universitário. Os mesmos apresentam alguns vícios: um profundo conhecimento “teórico”, mas, em conseqüência da carência de extensão da universidade na sociedade e da tendência à hiperespecializaçaõ acadêmica, desconhecem profundamente o Brasil real. São capazes de elaborarem artigos acadêmicos, teses, manifestos e artigos de jornal de excelente qualidade, mas não tem conseguido traduzi-los à linguagem popular, ou seja, a linguagem da prática política. E não apresentam um questionamento profundo da institucionalidade estatal por viverem da mesma, na maioria das vezes. Ocupados com questões de especialidade geral, não são capazes de fazerem compreender a unidade geral das especificidades.
Não tratemos, porém, de desistir ou anunciar o fracasso. Pelo contrário, o otimismo da vontade é mais necessário em tempos difíceis. Nesse caso, crise também deve significar oportunidade de revitalização. Ao invés de partidos que tratem de especialidades gerais que não estão presentes na vida cotidiana da maioria da classe trabalhadora, é preciso a criação de organismos locais de luta política que partam dos problemas locais que afligem o povo para, não através de textos longos ou de cursos maçantes, mas de prática política acompanhada de reflexão teórica, estabelecerem os nexos existentes entre a falta de merenda escolar, a falta de banheiro, a carência de moradia para os pobres e o desemprego e ausência de perspectiva para a maioria da juventude trabalhadora com o capitalismo, o Estado, o antagonismo entre capital e trabalho e a transitoriedade do tempo histórico.
Não que os partidos não devem existir. De modo algum! Eles são necessários, nem que seja para ensinar o que não deve ser feito. Todavia, eles partem do geral e não conseguem chegar no particular. Falam uma língua estranha do povo e estão ausentes do cotidiano da classe trabalhadora. Devemos apostar nossas fichas numa crise revolucionária que vai, aparentemente por si, formar consciência de classe revolucionária nas massas para que os partidos sejam uma direção? Ou seja, partir do geral e permanecer na generalidade? Ou, então, é preciso partir do particular, do específico, do cotidiano e, através da criação constante de fatos políticos, estimular a formação de um contexto de educação em que a classe se educa para a luta política, num processo que parte do particular para a totalidade?
Uibaí, inverno de 2010
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